quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Conto de uma noite de verão

Noite quente de verão e um grupo de seis amigas se reúne para mais uma confraternização, desta vez num lugarzinho afastado do litoral. Em comum a amizade e o fato de todas elas terem trabalhado para Roberto, assassinado um ano antes, quando se preparava para assumir a presidência da firma -- assim como seis anos antes fora assassinado seu irmão João, em pleno exercício do cargo.

Aos 29 anos, a loirinha Maria é um das amigas. Bonita e ambiciosa -- do tipo de secretária que não mede esforços em prol do empreendimento. Alguns fiéis assessores de Roberto também chegam para a festa, que depois seria descrita como "uma confraternização entre homens casados e mais velhos, com jovens solteiras". Oficialmente, não houve orgia.

A presença mais importante é a de Eduardo, irmão mais novo dos assassinados e provavelmente o próximo presidente da companhia. Com 37 anos, casado e com filhos, Eduardo sente a pressão da herança política, e dos perigos que ela representa, e aproveita o dia que antecede a confraternização com as meninas para espairecer velejando e nadando. Seu motorista trouxera coca-cola, rum, whiski e cerveja, e o "relax" continua durante a festa. Oficialmente, beberam pouco.

Lá pela meia-noite, Eduardo anuncia ao grupo que está cansado e que voltaria ao hotel, aproveitando para dar uma carona para Maria, que estaria se sentindo mal. Ninguém notara o mal súbito, e Maria sai tão depressa que esquece a bolsa. Eduardo raramente dirigia, mas leva o carro que seu motorista trouxera, deixando apenas mais um para todo o restante da turma.

A determinada altura do caminho, por estradas sem iluminação do litoral, Eduardo se perde e vai para a direita (rumo à praia) quando deveria ir para a esquerda (rumo ao ferry-boat), algo estranho para quem conhecia o lugar desde criança, como o quintal da própria casa.

O carro segue mais alguns quilômetros na escuridão e de repente voa pela beirada de uma ponte, mergulhando num canal. Eduardo consegue escapar com vida, tenta mas não consegue resgatar Maria, e volta a pé para o local da festa.

Os amigos correm para o lugar do acidente e mergulham, mas assim como impedira Eduardo, a correnteza impede que alcancem o carro. A polícia só é avisada por eles dez horas depois, quando até já sabia do acidente, alertada por pescadores.

Só então Maria é resgatada do carro submerso, sem vida.

Era julho de 1969, o lugar ermo a ilha de Chappaquiddick, na paradisíaca Martha's Vineyard, nordeste dos Estados Unidos.

Eduardo era Ted Kennedy, e Maria - Mary Jo Kopechne.

Por causa disso, Ted nunca foi presidente. Morreu hoje, 40 anos depois, de câncer no cérebro, jurando até o fim que não estava bêbado e que nunca teve nada com Mary Jo, que foi só isso, uma carona.
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